terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Chapeuzinho Amarelo


Chapeuzinho Amarelo – de Chico Buarque

 
Era a Chapeuzinho Amarelo
Amarelada de medo
Tinha medo de tudo,
aquela Chapeuzinho.
Já não ria

Em festa, não aparecia
Não subia escada, nem descia
Não estava resfriada, mas tossia
Ouvia conto de fada, e estremecia
Não brincava mais de nada,
nem de amarelinha

Tinha medo de trovão
Minhoca, pra ela, era cobra
E nunca apanhava sol,
porque tinha medo da sombra
Não ia pra fora pra não se sujar
Não tomava sopa pra não ensopar
Não tomava banho pra não descolar
Não falava nada pra não engasgar
Não ficava em pé com medo de cair
Então vivia parada, deitada,
mas sem dormir,
com medo de pesadelo

Era a Chapeuzinho Amarelo…

E de todos os medos que tinha
O medo mais que medonho era o medo do tal do LOBO.
Um LOBO que nunca se via,
que morava lá pra longe,
do outro lado da montanha,
num buraco da Alemanha,
cheio de teia de aranha,
numa terra tão estranha,
que vai ver que o tal do LOBO
nem existia.

Mesmo assim a Chapeuzinho
tinha cada vez mais medo do medo do medo
do medo de um dia encontrar um LOBO
Um LOBO que não existia.

E Chapeuzinho amarelo,
de tanto pensar no LOBO,
de tanto sonhar com o LOBO,
de tanto esperar o LOBO,
um dia topou com ele
que era assim:
carão de LOBO,
olhão de LOBO,
jeitão de LOBO,
e principalmente um bocão
tão grande que era capaz de comer duas avós,
um caçador, rei, princesa, sete panelas de arroz…
e um chapéu de sobremesa.

Mas o engraçado é que,
assim que encontrou o LOBO,
a Chapeuzinho Amarelo
foi perdendo aquele medo:
o medo do medo do medo do medo que tinha do LOBO.
Foi ficando só com um pouco de medo daquele lobo.
Depois acabou o medo e ela ficou só com o lobo.

O lobo ficou chateado de ver aquela menina
olhando pra cara dele,
só que sem o medo dele.
Ficou mesmo envergonhado, triste, murcho e branco-azedo,
porque um lobo, tirado o medo, é um arremedo de lobo.
É feito um lobo sem pelo.
Um lobo pelado.

O lobo ficou chateado.
Ele gritou: sou um LOBO!
Mas a Chapeuzinho, nada.
E ele gritou: EU SOU UM LOBO!!!
E a Chapeuzinho deu risada.
E ele berrou: EU SOU UM LOBO!!!!!!!!!!

Chapeuzinho, já meio enjoada,
com vontade de brincar de outra coisa.
Ele então gritou bem forte aquele seu nome de LOBO
umas vinte e cinco vezes,
que era pro medo ir voltando e a menininha saber
com quem não estava falando:

LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO BO LO

Aí, Chapeuzinho encheu e disse:
“Pára assim! Agora! Já! Do jeito que você tá!”
E o lobo parado assim, do jeito que o lobo estava, já não era mais um LO-BO.
Era um BO-LO.
Um bolo de lobo fofo, tremendo que nem pudim, com medo de Chapeuzim.
Com medo de ser comido, com vela e tudo, inteirim.

Chapeuzinho não comeu aquele bolo de lobo,
porque sempre preferiu de chocolate.
Aliás, ela agora come de tudo, menos sola de sapato.
Não tem mais medo de chuva, nem foge de carrapato.
Cai, levanta, se machuca, vai à praia, entra no mato,
Trepa em árvore, rouba fruta, depois joga amarelinha,
com o primo da vizinha, com a filha do jornaleiro,
com a sobrinha da madrinha
e o neto do sapateiro.

Mesmo quando está sozinha, inventa uma brincadeira.
E transforma em companheiro cada medo que ela tinha:

O raio virou orrái;
barata é tabará;
a bruxa virou xabru;
e o diabo é bodiá.
FIM

( Ah, outros companheiros da Chapeuzinho Amarelo:
o Gãodra, a Jacoru,
o Barãotu, o Pão Bichôpa…
e todos os trosmons).
 

Paródia


A paródia, definida pelo dicionário como sendo uma imitação cômica de uma composição literária. É uma característica que se faz cada vez mais presente nos textos atuais. O estilo de muitos jornalistas e publicitários, além de parafrástico, é também entremeado de paródias.

Para se entender uma paródia, é necessário o conhecimento do texto ou textos originais que tornaram possível a imitação. Nesse sentido, podemos afirmar que não pode existir uma paródia que não dialogue com o texto-matriz, ou seja, sempre existe entre este e a paródia o que os estudiosos da linguagem denominam intertextualidade.

Veja um exemplo de paródia

Texto-matriz: O lobo e o cordeiro
Vendo um lobo que certo cordeirinho matava a sede num regato, imaginou um pretexto qualquer para devorá-lo. E embora se achasse mais acima, acusou-o de sujar a água que bebia. O cordeiro explicou-lhe que bebia apenas com a ponta dos beiços e, além disso, estando mais abaixo, nunca poderia turvar-lhe o líquido. O lobo, exposto ao ridículo, insistiu:
— No ano passado, ofendeste meu pai.
—   No ano passado, eu não tinha nascido, replicou o cordeiro.
O lobo então:
—   Defendeste-te muito bem, mas nem por isso deixarei de comer-te!
 De que vale a defesa perante quem quer fazer o mal?
Esopo, Enciclopédia Mundial de fabulas. Vol III.

Paródia

Texto derivado:  O lobo e o cordeiro
Estava o cordeiro bebendo água, quando viu refletida, no rio, a sombra do lobo. Estremeceu, ao mesmo tempo, que ouvia a voz cavernosa:
- Vais pagar com a vida o teu miserável crime.
- Que crime? — perguntou o cordeirinho tentando ganhar tempo, pois já sabia que com lobo não adianta argumentar.
- O crime de sujar a água que eu bebo.
- Mas como posso sujara a água que bebes se sou lavado diariamente pelas máquinas automáticas da fazenda? — Indagou o cordeirinho.
Por mais limpo que esteja um cordeiro é sempre sujo para um lobo.
- E vice-versa. — pensou o cordeirinho, mas disse apenas: - Como posso sujar a sua água se estou abaixo da corrente?
- Pois se não foi você foi seu pai, foi sua mãe ou qualquer outro ancestral e eu vou comê-lo de qualquer maneira, pois como rezam os livros de lobologia, eu só me alimento de carne de cordeiro — finalizou o lobo preparando-se para devorar o cordeirinho.
Ein moment! Ein moment — gritou o cordeirinho traçando seu alemão kantiano. - Dou-lhe toda razão, mas faço-lhe uma proposta: se me deixar livre, atrairei para cá todo o rebanho.
- Chega de conversa — disse o lobo — vou comê-lo logo, e está acabado.
Espera aí — falou o cordeiro — isso não é ético. Eu tenho, pelo menos, direito a três perguntas.
- Está bem — cedeu o lobo irritado com a lembrança do código milenar da jungle.
— Qual é o animal mais estúpido do mundo?
- O homem casado — respondeu prontamente o cordeiro.
- Muito bem, muito bem! — disse o lobo, logo refreando, envergonhado, o súbito entusiasmo.
- Outra: a zebra é um animal branco de listras pretas ou preto de listras brancas?
- Um animal sem cor pintado de preto e branco para não passar por burro — respondeu o cordeirinho.
- Perfeito!— disse o lobo engolindo em seco. - Agora, por último, diga uma frase de Bernard Shaw.
- Vai haver eleições em 66 — respondeu logo o cordeirinho mal podendo conter o riso. - Muito bem, muito certo, você escapou! — deu-se o lobo por vencido. E já ia se preparando para devorar o cordeirinho quando apareceu  o caçador e o esquartejou.
Moral: Quando o lobo tem fome não deve se meter em filosofias
Millôr Fernandes. Fábulas Fabulosas

Fita verde no cabelo (nova velha estória)


Fita verde no cabelo (nova velha estória)

Havia uma aldeia em algum lugar, nem maior nem menor, com velhos e velhas que velhavam, homens e mulheres que esperavam, e meninos e meninas que nasciam e cresciam.

Todos com juízo, suficientemente, menos uma meninazinha, a que por enquanto. Aquela, um dia, saiu de lá, com uma fita verde inventada no cabelo.

Sua mãe mandara-a, com um cesto e um pote, à avó, que a amava, a uma outra e quase igualzinha aldeia.

Fita-Verde partiu, sobre logo, ela a linda, tudo era uma vez. O pote continha um doce em calda, e o cesto estava vazio, que para buscar framboesas.

Daí, que, indo, no atravessar o bosque, viu só os lenhadores, que por lá lenhavam; mas o lobo nenhum, desconhecido nem peludo. Pois os lenhadores tinham exterminado o lobo.

Então, ela, mesma, era quem se dizia:

– Vou à vovó, com cesto e pote, e a fita verde no cabelo, o tanto que a mamãe me mandou.

A aldeia e a casa esperando-a acolá, depois daquele moinho, que a gente pensa que vê, e das horas, que a gente não vê que não são.

E ela mesma resolveu escolher tomar este caminho de cá, louco e longo, e não o outro, encurtoso. Saiu, atrás de suas asas ligeiras, sua sombra também vinha-lhe correndo, em pós.

Divertia-se com ver as avelãs do chão não voarem, com inalcançar essas borboletas nunca em buquê nem em botão, e com ignorar se cada uma em seu lugar as plebeinhas flores, princesinhas e incomuns, quando a gente tanto por elas passa.

Vinha sobejadamente.

Demorou, para dar com a avó em casa, que assim lhe respondeu, quando ela, toque, toque, bateu:

– Quem é?

– Sou eu… – e Fita-Verde descansou a voz. – Sou sua linda netinha, com cesto e pote, com a fita verde no cabelo, que a mamãe me mandou.

Vai, a avó, difícil, disse: – Puxa o ferrolho de pau da porta, entra e abre. Deus te abençoe. Fita-Verde assim fez, e entrou e olhou.

A avó estava na cama, rebuçada e só. Devia, para falar agagado e fraco e rouco, assim, de ter apanhado um ruim defluxo. Dizendo: – Depõe o pote e o cesto na arca, e vem para perto de mim, enquanto é tempo.

Mas agora Fita-Verde se espantava, além de entristecer-se de ver que perdera em caminho sua grande fita verde no cabelo atada; e estava suada, com enorme fome de almoço. Ela perguntou:

– Vovozinha, que braços tão magros, os seus, e que mãos tão trementes!

– É porque não vou poder nunca mais te abraçar, minha neta… – a avó murmurou.

– Vovozinha, mas que lábios, aí, tão arroxeados!

– É porque não vou nunca mais poder te beijar, minha neta… – a avó suspirou.

– Vovozinha, e que olhos tão fundos e parados, nesse rosto encovado, pálido?

– É porque já não estou te vendo, nunca mais, minha netinha… – a avó ainda gemeu.

Fita-Verde mais se assustou, como se fosse ter juízo pela primeira vez. Gritou: – Vovozinha, eu tenho medo do Lobo!…

Mas a avó não estava mais lá, sendo que demasiado ausente, a não ser pelo frio, triste e tão repentino corpo.

João Guimarães Rosa

Extraído do livro Meus primeiros contos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Antologia de Contistas Brasileiros vol. 3, 2001.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Divagações

Mais uma produção do meu autor preferido. Rsrsrs

Divagações

 

Tem horas que uma mancada

Vale mais na vida que muito acerto

Mas há momentos que no aperto

A vida te acerta uma pancada

 

Nessas horas que a gente pensa

O que faço aqui, nesse mundo esquisito

Vagando a toa em pensamentos

Onde nada se vê e nada se escuta

 

Bom seria se pudéssemos voltar no tempo

Reparar os erros, quem sabe os acertos

O problema seria o que procurar

Pois se todos fizessem a mesma viagem

O certo nem sempre seria certo

 

Tão certo quanto o certo seria a certeza

De que no mundo perfeito

Às vezes os erros valem muito mais

Do que o acerto sem sentido

Do que o correto programado

 

Porquanto o tropeço, como fato consumado

Nada mais é do que a vida

Repleta de passado

Ensinando-lhe que tudo nesse mundo

Tem algum significado

 

Entendê-lo é outro passo

Como de costume, bem complicado

Mas se olharmos com desembaraço

Encontraremos muito mais do que respostas

 

Acharemos o compasso

Do futuro em nosso encalço

Seguindo a passos largos

Ofecerendo-lhe tantas propostas

Que só não as encontrará

Quem não queira na vida nunca mancar

 

Jackson Burini

terça-feira, 23 de setembro de 2014

O que você pensa e sente sobre a escola de Ensino Médio?


 Olá aluno(a),
 

Estou aqui hoje para conversar com você e conhecê-lo um pouco mais. Apesar de passarmos um tempo juntos não o conheço o suficiente para saber o que pensa sobre a nossa escola, quais são seus planos, o que espera conseguir frequentando as aulas, coisas desse tipo. Afinal, só pelo fato de ter o trabalho de vir até aqui me diz que alguma coisa você espera alcançar. Gostaria que fizesse uma reflexão comigo: esse período passado na escola tem contribuído para alcançar o que você deseja ou aquilo que espera não acontece, e por que não acontece. É bem verdade que nunca estamos satisfeitos com nada, seja em casa, no trabalho, com a gente mesmo, e não seria diferente na escola. Boa parte da nossa vida passamos na escola, é lá que aprendemos, fazemos amigos e planejamos nosso futuro, então peço a você que pense no que espera encontrar nesse ambiente, como gostaria que as informações fossem passadas, mas dentro da realidade, objetivamente, apresentando problemas e propondo soluções para que, com planejamento, possamos encontrar soluções viáveis que atendam aos seus anseios e tornem o ambiente escolar cada vez melhor.

 
Abraços,

Professora Alessandra Burini
 

 

sábado, 30 de agosto de 2014

Poli titica verborrágica


Poli titica verborrágica

 

Eu te controlo, tu me controlas, nós nos descontrolamos, eles tramitam e todos se ferram.  Opa, acho que a conjugação está correta, foi só o verbo que transigiu.

Como é?

Intransitável, entendeu!?

Espere um pouco, deixe-me entender a onomatopeia da mixórdia. Afinal, transigiu ou transitou? E quem controla o quê?

Controle, que controle, é verbo, não tem controle. Onde já se viu verbo com controle, desconheço. Intransitável, intratável, intragável, externo, tanto faz.

Ainda tem mais? De onde saiu esse externo na conversa?

Do controle oras.

Mas que raio de controle é esse!? Não acabou de dizer que verbo não tem controle?

Que verbo, quem está falando de verbo aqui?

Estamos falando de que então?

De política, do que mais seria? Entendeu?

Nem uma linha sequer.

Ufa, porque se entendesse não estaríamos falando de política, ou você acha que controla alguma coisa que acontece nesse país?

 

Jackson Burini